terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

A lei não é seguida e inocentes continuam morrendo no Brasil


O DIREITO Á SAÚDE NO BRASIL APÓS 1988.

I – Conceito de Saúde
 A saúde humana, segundo a conceituação datada de 1978 no âmbito da Declaração de Alma – Ata, URSS, e proclamada pela Conferência Internacional sobre cuidados primários de saúde, é assim entendida:
 “A saúde, estado de completo bem estar físico, mental e social, e não simplesmente a ausência de doença ou enfermidade, é um direito fundamental, e a consecução do mais alto nível possível de saúde é a mais importante meta social mundial, cuja realização requer a ação de muitos setores sociais e econômicos, além do setor saúde”.



Dispõe a Constituição da República Federativa do Brasil em seu artigo 196 que :
 “A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”.

 No que se refere às ações e serviços de saúde, que são considerados de relevância pública, a Constituição no artigo 197, diz que caberá à lei dispor sobre sua regulamentação, fiscalização e controle. Diz, ainda, que eles integram uma rede regionalizada e hierarquizada, constituindo um sistema único. Uma de suas diretrizes é a participação da comunidade (artigo 198, inciso III).
Para tanto, em 19 de dezembro de 1990 foi promulgada a lei da saúde, de nº 8.080 e, logo a seguir, em 28 de dezembro, a lei 8.142, dispondo sobre a participação da comunidade na gestão do SUS (Sistema Único de Saúde).

Antes da Constituição Federal de 1988, no território nacional o atendimento médico nos serviços públicos de saúde, apenas era prestado àquelas pessoas que estivessem inscritas no Instituto Nacional de Seguro Social, o INSS. Felizmente, esse tempo já passou e agora todos, com registro na Carteira de Trabalho ou não, sejam pobres ou ricos, têm direito a ser atendidos no Sistema Único de Saúde, o SUS (art.196 a 200 da Constituição). Essa transformação deveu-se à luta pelo direito empreendida por milhões de brasileiros durante décadas e que logrou sensibilizar nossos legisladores.
Tanto a Constituição Federal (art.198-II), como a Lei da Saúde (SUS) nº 8.080/90, no seu artigo 7º, inciso II, fazem referência ao atendimento integral do paciente, significando um conjunto de ações e serviços preventivos e curativos, incluindo-se, no campo da saúde mental, por exemplo, a psicoterapia, a reabilitação e a distribuição gratuita de medicamentos, independentemente da condição financeira da pessoa. No inciso IV, a lei da saúde reforça o princípio da igualdade, quando dispõe: “Igualdade da assistência à saúde, sem preconceitos ou privilégios de qualquer espécie;
 II – Gratuidade

É na legislação infraconstitucional que vamos encontrar o fundamento legal para a gratuidade das ações e serviços de saúde. Além do artigo 197 da Constituição Federal considerar os serviços de saúde relevância pública.

A gratuidade está garantida no texto da Lei da Saúde, ou seja, na Lei 8.080/90, em seu artigo 43 :
 “A gratuidade das ações e serviços de saúde fica preservada nos serviços públicos contratados, ressalvando-se as cláusulas dos contratos ou convênios estabelecidos com as entidades privadas.”

 Por outro lado, no âmbito da Constituição do Estado de São Paulo, há também um dispositivo assegurando a universalidade e a gratuidade: artigo 222, incisos IV e V, que dispõem:
 “As ações e os serviços de saúde executados e desenvolvidos pelos órgãos e instituições públicas estaduais e municipais, da administração direta, indireta e fundacional, constituem o sistema único de saúde, nos termos da Constituição Federal, que se organizará ao nível do Estado, de acordo com as seguintes diretrizes e bases:

IV — universalização da assistência de igual qualidade com instalação e acesso a todos os níveis, dos serviços de saúde à população urbana e rural;
 V – gratuidade dos serviços prestados, vedada a cobrança de despesas e taxas, sob qualquer título”.
 Essas diretrizes também estão reiteradas no Código de Saúde Paulista, lei complementar estadual nº 791, de 09/03/1995, em seu artigo 12.
Tudo isso significa, então, que o direito aos serviços de saúde é um direito que cada um poderá cobrar do Estado através de ação judicial. Trata-se de um direito público subjetivo, conforme se vê da leitura do artigo 2o. , parágrafo 1o. do Código de Saúde Paulista:
 O direito à saúde é inerente à pessoa humana, constituindo-se em direito público subjetivo”.
 Reforçando tal diretriz, a Lei Orgânica do Município de São Paulo, no seu artigo 215, § 2º, prevê:
 “É vedado cobrar do usuário pela prestação das ações e dos serviços no âmbito do sistema único de saúde”.
 III – Sistema Único de Saúde/SUS
 Os serviços de saúde públicos têm um só comando, sendo unificados e distribuídos pelos vários estados e municípios. É o dinheiro dos cofres federais que será distribuído para cada um, em parcelas. Assim, o serviço estadual recebe dinheiro federal e o serviço municipal também o recebe.
A regra constitucional, após a Emenda 29, de 13/09/2000, vincula a verba destinada à promoção e assistência à saúde, ou seja, não poderá deixar de ser aplicada em saúde. Até o ano de 2004 os estados deverão aplicar 12% e os municípios 15% de sua receita:
 Art. 198 – A ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único, organizado de acordo com as seguintes diretrizes:
I – descentralização, com direção única em cada esfera de governo;
II – atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais;
III – participação da comunidade.
§ 1º- O sistema único de saúde será financiado, nos termos do art.195, com recursos do orçamento da seguridade social, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, além de outras fontes.
§ 2º- A União, os Estados, o Distrito Federal e os municípios aplicarão, anualmente, em ações e serviços públicos de saúde recursos mínimos derivados da aplicação de percentuais calculados sobre:
I – no caso da União, na forma definida nos termos da lei complementar prevista no § 3;
II – no caso dos Estados o produto da arrecadação dos impostos a que se refere o art. 155 e dos recursos de que tratam os arts. 157 e 159, inciso I, alínea a, e inciso II, deduzidas as parcelas que forem transferidas aos respectivos Municípios;
III – no caso dos municípios e do Distrito Federal, o produto da arrecadação dos impostos a que se refere o art. 156 e dos recursos de que tratam os arts. 158 e 159, inciso I, alínea b e § 3º.
§ 3º- Lei complementar, que será reavaliada pelo menos a cada cinco anos, estabelecerá:
I – os percentuais de que trata o § 2º;
II – os critérios de rateio dos recursos da União vinculados à saúde destinados aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, e dos Estados destinados a seus respectivos Municípios, objetivando a progressiva redução das disparidades regionais;
III – as normas de fiscalização, avaliação e controle das despesas com saúde nas esferas federal, estadual, distrital e municipal;
IV – as normas de cálculo do montante a ser aplicado pela União.
 Sempre é bom lembrar que a “assistência à saúde é livre à iniciativa privada”, nos termos do artigo 199 da Constituição. O § 1º assegura à iniciativa privada sua participação no sistema único de saúde de forma complementar:
 ”As instituições privadas poderão participar de forma complementar do sistema único de saúde, segundo diretrizes deste, mediante contrato de direito público ou convênio, tendo preferência as entidades filantrópicas e as sem fins lucrativos”.
 Sendo que o § 2º determina:
 “É vedada a destinação de recursos públicos para auxílios ou subvenções às instituições privadas com fins lucrativos”.

 Portanto, a classe empresarial com capacidade de investimento poderá à vontade investir na área da saúde. Deve ajudar o SUS quando este não reúna condições de atender à população e não o contrário.
 IV – Participação da Comunidade
 A lei da saúde, n. 8.080/90, diz no seu artigo 33 o seguinte:
 “Os recursos financeiros do Sistema Único de Saúde – SUS serão depositados em conta especial, em cada esfera de sua atuação, e movimentados sob fiscalização dos respectivos conselhos de saúde”. Essa mesma lei cria, na esfera federal, o Conselho Nacional de Saúde (art. 12 e 37).
 Os Conselhos de Saúde são: nacional, estaduais e municipais.
Trata-se de um organismo de controle social. Participa da discussão de políticas públicas de saúde.Trata-se de órgão de atuação independente do governo, embora faça parte de sua estrutura.
A Lei 8.142/90, no seu artigo 1º, § 2º, diz :
“O Conselho de Saúde, tem caráter permanente e deliberativo, órgão colegiado composto por representantes do governo, prestadores de serviço, profissionais de saúde e usuários, atua na formulação de estratégias e no controle da execução da política de saúde na instância correspondente, inclusive nos aspectos econômicos e financeiros, cujas decisões serão homologadas pelo chefe do poder legalmente constituído em cada esfera do governo”.
 Diz, ainda, o artigo 4o., II, da lei acima referida que, para receberem os recursos financeiros, os Municípios, os Estados e o Distrito Federal deverão contar com o Conselho de Saúde, com composição paritária de acordo com o Decreto 99.438, de 7 de agosto de 1990.
Com relação à fonte de custeio dos Conselhos de Saúde, determina a Resolução n. 33, de 23.12.92, editada pelo Conselho Nacional de Saúde, em seu “
item 3. Estrutura dos Conselhos de Saúde”, que:“Os organismos de Governo Estadual e Municipal deverão dar apoio e suporte administrativo para a estruturação e funcionamento dos Conselhos, garantindo-lhes dotação orçamentária. O Conselho de Saúde deverá ter como órgãos o Plenário e o Colegiado Pleno e uma Secretaria Executiva com assessoria técnica. O Plenário ou Colegiado Pleno será composto pelo conjunto dos Conselheiros.”

 Nessa mesma orientação, o Relatório Final da 10a. Conferência Nacional de Saúde, em setembro de 1996, estabeleceu em seu
 “item 3.2. Funcionamento dos Conselhos de Saúde” que “Para assegurar o pleno funcionamento dos Conselhos de Saúde, os gestores do SUS devem:1.1. colocar à disposição dos Conselhos de Saúde infra-estrutura e recursos financeiros necessários para o pleno exercício de suas funções. Eles devem dispor de dotação orçamentária própria, espaço físico permanente, órgão de assessoramento técnico, secretaria executiva e de apoio administrativo; 1.2. ressarcir aos Conselheiros de Saúde suas despesas de deslocamento e pagamento de diárias, quando estiverem em exercício de suas funções.”
 E, segundo a orientação do Conselho Nacional de Secretários Municipais de Saúde- CONASEMS, em seu Manual n. 1, p.37, do ano de 2000,
 “A Secretaria de Saúde ou Departamento de Saúde deve fornecer infra-estrutura necessária ao pleno funcionamento do Conselho. Isto implica no fornecimento de espaço físico, recursos humanos e recursos financeiros, devendo ser garantido no orçamento das Secretarias, tanto Estaduais quanto Municipais, recursos financeiros que viabilizem o trabalho do Conselho, que muitas vezes irá solicitar a realização de estudos, pesquisas e cursos de aprimoramento, subsidiando assim, suas decisões.”
Finalizando, é importante salientar que a Constituição Federal passou a usar a expressão “seguridade social ” para referir-se ao direito à saúde, à previdência social e à assistência social. Por isso, quando falamos seguridade social não devemos nos lembrar apenas do INSS, mas, também do SUS e da LOAS (Lei Orgânica da Assistência Social).
Diz o artigo 194 da CF:
 “A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social ”.
 O custeio da seguridade social caberá a toda a sociedade, sejam empregadores, empresas, trabalhadores e outros tipos de contribuintes, sempre sob o prisma da eqüidade na forma de participação (art. 194, V), ou seja, quem tem mais recursos contribuirá com maior quantia.
 Inês do Amaral Büschel, em 10 de agosto de 2010.
(texto originalmente publicado na Rev. de Direitos Difusos do IBAP, ano IV, vol. 19, pág.2553/7, entre maio-junho de 2003)

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